A íntegra da decisão do Ministro CEZAR PELUSO, proferida nos autos do MANDADO DE SEGURANÇA 27875, impetrado pela REPÚBLICA ITALIANA contra a decisão do MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, TARSO GENRO, nos autos do PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº 08000.011373/2008-83, concedendo refúgio ao extraditando CESARE BATTISTI:

DECISÃO:
1. Como o pedido de extradição não foi ainda apreciado e, por conseguinte, nem deferido nem negado, não pende efeito jurídico irreversível, nem capaz de sacrificar eventual direito subjetivo do ora impetrante. Do exposto, indefiro a liminar.
2. Notifique-se a autoridade, para prestar informações, e, na condição de litisconsorte passivo necessário, Cesare Batisti, para, querendo, responder à impetração no prazo de 10 (dez) dias. Após o decurso do prazo, com ou sem manifestação, dê-se vista ao Procurador-Geral da República.
Publique-se. Brasília, 10 de fevereiro de 2009. Ministro CEZAR PELUSO, Relator

Publicado no Diário da Justiça de hoje, 16.02.2009
O ministro Cezar Peluso negou, nesta terça-feira (10), pedido de liminar em Mandado de Segurança (MS 27875), ajuizado no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo advogado do governo da Itália, contra a decisão do ministro da Justiça, Tarso Genro que, em 13 de janeiro último, concedeu a condição de refugiado a Cesare Battisti, pivô de um pedido de Extradição (Ext 1085) que tramita no STF.

O governo italiano pedia a suspensão do ato do ministro Tarso Genro, alegando que “sua consideração poderá gerar o prejuízo do processo de extradição de que a impetrante (Itália) é autora, caso a Suprema Corte entenda pertinente a aplicação ao caso do art. 33 da Lei nº 9.474/97(*)”. Para o advogado, o ato do ministro Tarso Genro seria “manifestamente ilegal, inconstitucional e abusivo, praticado com o indisfarçável objetivo de obstar o seguimento do processo de extradição instaurado perante essa Suprema Corte, a pedido da impetrante [Itália], em desfavor do beneficiário do refúgio [Cesare Battisti]”.

O ministro, contudo, não encontrou os requisitos necessários para a concessão da liminar. Como o pedido de extradição não foi ainda apreciado pelo STF, não existe nenhuma decisão irrecorrível “capaz de sacrificar eventual direito subjetivo do ora impetrante [república italiana]”, frisou Cezar Peluso.

O relator determinou, ainda, que se notifique o ministro da Justiça para prestar informações e que Cesare Battisti, na condição de litisconsorte passivo, responda, caso queira, ao Mandado de Segurança no prazo de 10 dias. Assim que terminar o prazo, com ou sem manifestação dessas duas partes, o pedido deve ser encaminhado ao procurador-geral da República para que se pronuncie.

Extradição

O governo italiano pediu a extradição (Ext 1085) de Cesare Battisti, condenado pela Justiça italiana, em 13 de dezembro de 1988, pelo homicídio de quatro pessoas, naquele país, crimes que teriam sido cometidos entre 1977 e 1979.

NOTA: O fato de não ter sido concedida liminar não tem maiores efeitos sobre a extradição, porque o STF ainda não concedeu alvará de soltura a Cesare Battisti e, pelo que se nota, os dois processos vão ser julgados ao mesmo tempo. Logo, realmente não havia necessidade de concessão de efeito suspensivo ao mandado de segurança e isso não vai interferir na questão central, que é a extradição.

FONTE: Notícias do STF
O governo da Itália impetrou Mandado de Segurança (MS 27875), no Supremo Tribunal Federal, contra ato do ministro da Justiça, Tarso Genro, que deferiu a condição de refugiado a Cesare Battisti, no dia 13 de janeiro. Autor do pedido de Extradição (Ext 1085) de Battisti, em curso no STF, o governo italiano pede no MS a suspensão liminar do ato que resultou no refúgio, sob a alegação de que contraria a Convenção de 1951 e a Declaração Universal dos Direitos Humanos. No mérito, o MS pede a anulação da decisão do ministro da Justiça.

Cesare Battisti foi condenado na Justiça italiana por homicídio premeditado do agente penitenciário Antonio Santoro e de Pierluigi Torregiani, Lino Sabbadin e Andréa Campagna. Ele está preso no Brasil desde março de 2007.

No MS, a Itália alega que Battisti não participou apenas de crimes políticos – ainda que militasse na base da organização política denominada “Proletários Armados para o Comunismo (PAC) – mas que foi condenado por crimes comuns. “Não se trata de perseguição política, mas de legítima persecução judicial para execução de penas criminais decorrentes de bárbaros crimes comuns, absolutamente desvinculados de qualquer base político-ideológica”, afirma o advogado que representa o governo italiano.

Segundo ele, crimes comuns não justificariam a concessão de refúgio. Nesse sentido, o advogado cita a Convenção de 1951 (art. 1, F, b e c) e a Lei nº 9.474/97 (art. 3º, III: “Não se beneficiarão da condição de refugiado os indivíduos que tenham cometido crime contra a paz, crime de guerra, crime contra a humanidade, crime hediondo, participado de atos terroristas ou tráfico de drogas”). “Não há dúvida de que os crimes de homicídio qualificado perpetrados pelo extraditando configuram crimes hediondos”, afirma.

O MS ressalta, por fim, que a Corte Europeia de Direitos Humanos não apontou a ocorrência de violação dos direitos humanos e das liberdades fundamentais de Cesare Battisti, nem mesmo perseguição contra o extraditando, na Itália ou na França, para onde fugiu antes de ser preso no Brasil. O pedido de suspensão do refúgio será distribuído a ministro do STF nesta terça-feira.

Competência

Segundo a defesa do governo italiano, é de competência originária do STF processar e julgar o Mandado de Segurança em questão, "dado que as questões relacionadas com a extradição são de sua competência, independentemente da qualidade da autoridade apontada coatora, tratando-se de habeas corpus e de mandado de segurança”. Para fundamentar o cabimento do pedido, os advogados citaram a decisão do Plenário do Tribunal na Reclamação 2069, onde, conforme apontado no Mandado de Segurança, "mais do que relação de conexidade entre esta ação e a extradição, tem-se verdadeira relação de prejudicialidade, porquanto eventual decisão suspendendo os efeitos do ato concessivo do refúgio e eventual decisão consequente desconstituindo-o, ou não, terão inequívoca repercussão sobre a jurisdição da Suprema Corte na apreciação e julgamento do processo de extradição". Essa seria a justificativa para que a defesa entrasse com o mandado de segurança no STF, em vez de fazê-lo no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, conforme preceitua o artigo 105, inciso I, "b", da Constituição Federal, é a Corte competente para processar e julgar, originariamente, os mandados de segurança contra ato de ministro de Estado.

Manifestação da Itália

Nas informações encaminhadas ao STF nesta segunda-feira, o governo da Itália aponta que a defesa de Battisti destaca haver diferenças na causa de pedir tanto no processo administrativo de refúgio quanto no processo administrativo de extradição. “O extraditando requereu ao CONARE/MJ o reconhecimento da condição de refugiado com base no art. 1º, I, da Lei nº 9.474/97 (...), enquanto na extradição se pediu a entrega do cidadão italiano Cesare Battisti à Justiça italiana para cumprimento de sentenças condenatórias transitadas em julgado pelo cometimento de crimes de homicídio qualificado -- cabendo privativamente à Suprema Corte se manifestar sobre se tais infrações consubstanciam, ou não, crimes de natureza política”, salientam os advogados.

Segundo a manifestação do governo italiano, “em consequência, o pedido de refúgio foi deferido com base em alegado fundado temor de perseguição por motivo de opiniões políticas (esses os fatos que fundamentaram a concessão do refúgio), restando ao Supremo Tribunal Federal, no exercício daquela sua competência privativa (art. 102, I, g, da CF), versar, no julgamento da extradição, coisa diversa - se os delitos pelos quais o extraditando foi condenado e pelos quais a República Italiana requereu a sua extradição configuram ou não, a teor dos arts. 5º, LII, da CF, e 77, VII, e §§ 1º e 2º, da Lei nº 6.815/80 - matéria que não está em causa no julgamento do pedido de refúgio, por isso que a decisão que o concedeu teve como base ‘fatos que, segundo o Recorrente, fundamentam seu temor de perseguição’, consubstanciados no ‘art. 1º, inc. I, da Lei nº 9.474/97’, conforme parte dispositiva da decisão do Senhor Ministro da Justiça”.

Prisão

O governo italiano defende ainda a permanência de Battisti na prisão, uma vez que “o extraditando fugiu da Itália para se livrar dos processos pelos quais veio a ser condenado com trânsito em julgado e, homiziado na França, de lá também fugiu para o Brasil quando se encontrava em liberdade condicionada, na pendência de julgamento de recurso perante o Conselho de Estado da República Francesa contra decisão que deferira a sua extradição para a Itália”. Para ele, a questão da liberdade de Battisti deve ser analisada e deliberada pelo STF dentro do processo de extradição em curso.

Fonte: Notícias do Supremo Tribunal Federal
Por Vitor Hugo Brandalise, Mariângela Gallucci e Talita Figueiredo, de O Estado de S. Paulo.

Segundo especialistas, prisão de réus só após última condenação deve aumentar sensação de impunidade

SÃO PAULO - O entendimento do Supremo - firmado no julgamento de um pedido de habeas corpus do agricultor Omar Coelho Vitor, acusado de tentativa de homicídio em Minas - corrobora o princípio constitucional da presunção de inocência, que garante ao réu responder em liberdade até a condenação definitiva. "Não quer dizer que os condenados em primeira e segunda instâncias serão soltos. Vai é haver maior chance de se responder em liberdade", explica Calandra. "Os juízes continuarão podendo decretar prisão preventiva, se houver motivo, como risco à segurança pública."

O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Fernando Mattos, criticou a decisão. "O sistema processual brasileiro permite muitos recursos, que podem ser usados de forma ilimitada. Como há quatro instâncias no sistema brasileiro, e o habeas corpus pode ser usado em todas elas, o efeito é que a condenação pode nunca ocorrer", disse. "Não existe país que ofereça tamanha proteção", alertou o ministro Joaquim Barbosa no julgamento em que foi voto vencido. A decisão do STF foi tomada por 7 a 4.

O subprocurador-geral de Justiça do Rio, Antônio José Moreira, também condenou a medida. "Vai beneficiar, sobretudo, os criminosos das camadas sociais mais elevadas que podem contratar bons advogados. Vai gerar um clima da mais completa impunidade." Para ele, o entendimento de que um condenado em primeira e segunda instâncias tenha inocência presumida "é dizer que a decisão de um tribunal não tem valor".

O presidente da OAB-Rio, Wadih Damous, disse considerar que a decisão, do ponto de vista técnico, "está de acordo com a Constituição Federal e os princípios gerais do direito". "O STF abordou o assunto de forma clara. Agora, a Justiça deve ser mais rápida e não deixar que esses processos tramitem na eternidade."

Defensores dos Direitos Humanos também afirmam que a sensação de impunidade deve aumentar. "Réus confessos que saem caminhando dos tribunais transmitem à população a sensação de terra sem lei", diz Denis Mizne, diretor executivo do Instituto Sou da Paz. "Acaba estimulando a violência."
Chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) a manifestação da Advocacia Geral da União (AGU) na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 153) ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) por meio da qual questiona a anistia dada aos representantes do Estado (policiais e militares) que, durante o regime militar, praticaram atos de tortura.

A pedido do relator da ação, ministro Eros Grau, a AGU enviou ao STF as suas informações sobre a ADPF. Em sua opinião, a ação não deve ser conhecida, ou seja, não deve ser aceita pelo Supremo. Para a AGU, a OAB não demonstrou a existência de controvérsia judicial a que se refere a lei. No documento, a AGU sustenta que a regra é de que a anistia se dirija aos chamados crimes políticos, nada impedindo, no entanto, que seja concedida a crimes comuns.

Destaca que a própria Constituição Federal de 1988 reforça o caráter amplo e irrestrito da anistia a que se refere a Lei 6.683/79 e sustenta que “uma vez que a anistia abrange os mais diversos crimes, comuns ou políticos, qualquer que seja a natureza – desde que tenham sido praticados em decorrência de razões políticas – é contraditório falar-se em enumeração dos referidos delitos, sob pena de conferir-se à medida caráter restritivo e dissidente da pretensão do legislador”.

Ressaltou também que, ainda que haja a revisão da lei, já teria ocorrido a extinção da punibilidade relativa a tais delitos por causa da prescrição, considerando que já se passaram mais de 29 anos desde o cometimento. Observou ainda que a OAB esperou para questionar a lei quase trinta anos após a sua vigência e vinte anos após a vigência da Constituição Federal “para mudar a interpretação e tardiamente apresentar uma extemporânea irresignação”.

Além disso, diz que a própria OAB concordou com a edição da lei na ocasião de sua entrada em vigor e que agora “volta-se contra sua própria opinião, essencial àquela época para a formação da mentalidade que permitiu entender que todos os sujeitos que eventualmente tivessem praticado quaisquer ilícitos fossem beneficiários da anistia”.

Por fim, pede que o Supremo não conheça a ADPF e, caso venha a aceitar, opina pela sua improcedência.

Origem do debate

Na Arguição de Descumprimentos de Preceito Fundamental 153, a OAB aponta que o primeiro artigo da Lei da Anistia (Lei Nº 6683/79) precisa de uma interpretação mais clara no que se refere a considerar conexos e igualmente perdoados os crimes “de qualquer natureza” relacionados aos crimes políticos ou praticados por motivação política no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979. Para a OAB, a lei “estende a anistia a classes absolutamente indefinidas de crime”.

Nesse contexto, pede ao Supremo que a anistia não seja estendida aos autores de crimes comuns praticados por agentes públicos acusados de homicídio, desaparecimento forçado, abuso de autoridade, lesões corporais, estupro e atentado violento ao pudor contra opositores ao regime político da época.

O documento da OAB diz que é “irrefutável que não podia haver e não houve conexão entre os crimes políticos, cometidos pelos opositores do regime militar, e os crimes comuns contra eles praticados pelos agentes da repressão e seus mandantes no governo”. A entidade chama de “aberrante desigualdade” o fato de a anistia servir tanto para delitos de opinião (cometidos por pessoas contrárias ao regime) e os crimes violentos contra a vida, a liberdade e a integridade pessoal cometidos contra esses opositores, no que a OAB supõe ser “terrorismo do Estado”.

Fonte: Supremo Tribunal Federal